sexta-feira, 17 de agosto de 2012




UM CASO DE AMOR




Texto elaborado para responder a uma questão da Revista Encontro, de 1º de junho/12, Nº 132, encaminhada à Universidade do Estado de MG e cuja incumbência da resposta foi delegada a mim:

- Ter um relacionamento estável ajuda a ter boas notas?

Vou discorrer sobre "bons motivos para se ter um caso de amor" e não, necessariamente, "um parceiro estável". Na verdade, é sobre isso que trabalho com os alunos da Universidade do Estado de Minas Gerais -UEMG, quando presto-lhes atendimento psicológico, através do Centro de Psicologia Aplicada e do Núcleo de Apoio ao Estudante - NAE.


-Um caso de amor? - Sim. Em primeiro lugar, para sermos capazes de produtividade (produção + qualidade), seja na escola ou no trabalho, é preciso que vivamos um caso de amor com a gente mesmo. Sem se descobrir, sem se aceitar e celebrar a pessoa que você é, não é possível escolher um curso ou um trabalho no qual você se reconheça.                                  

 

 Mas quando temos uma autoimagem positiva, confiamos em nós mesmos, buscamos um caminho em que estejamos bem e somos capazes de criar, de nos dedicarmos ao estudo ou ao trabalho, sem sermos repetidores de regras e padrões. Então, o resultado em notas escolares ou nos scores da avaliação de desempenho será positivo, se não tivermos pessoas com patologias graves avaliando-nos.

Como o ser humano é um ser em processo, um projeto, um ser em construção, temos que ter outros casos de amor pela vida a fora. E aí vale o amor por uma causa nobre, a um ideal ou a uma pessoa.
É que o amor verdadeiro é o grande motivo que nos move na vida, é o nosso motivo-ação. É ele que nos impulsiona, nos energiza e, especialmente, dá sentido às nossas ações e experiências. Um dos males da humanidade é a vivência do vazio, da falta de sentido para a vida. E uma pessoa que vive isso não pode ser criativa, produtiva, não pode viajar através da sua percepção, de uma maneira positiva, e ser criadora de um universso pessoal iluminado.

É claro que amar alguém, se sentir amada, considerada e respeitada torna-nos pessoas mais fortes, mais positivas e, portanto, mais produtivas em todos os campos da vida. Porém, apenas ter um parceiro estável não é garantia de amor, respeito e alegria. É preciso que haja qualidade nesta relação interpessoal. E qualidade aqui é sinônimo de confiança, comunicação genuína e liberdade. Uma pessoa, por exemplo, ciumenta vai tolher o crescimento do parceiro, vai amarrá-lo em suas carências e desconfianças. E se as carências dos dois se casam, a relação pode ser até estável, mas a felicidade voará pela janela como fez Eros, fugindo de sua Psiqué, dizendo-lhe: " O AMOR não sobrevive sem confiança". 


Uma pessoa apaixonada ou em "limerence" - como dizem os franceses - pode estar harmonizada e até mais equilibrada. Aí será capaz, sem dúvida, de dirigir sua energia amorosa para a criação ou um trabalho rotineiro, produzindo sem maior esforço. Ou, pelo contrário, pode ter perdido o foco na realidade, enxergando apenas seu parceiro e o "próprio umbigo" e então não ser capaz de direcionar seu tônus para a produtividade no estudo e em qualquer atividade laboral.

No atendimento psicológico realizado aos nossos alunos o que busco é rever com eles "seus casos de amor", para que tenham na vivência do amor verdadeiro a si e aos outros, a sustentação e o direcionamento para uma vida que faça sentido para eles. E percebo sim, que aqueles que se sustentam em seu amor próprio, têm uma relação, verdadeiramente, amorosa com seus parceiros estáveis, enfrentam com garra seus conflitos e embates do cotidiano. Com o amadurecimento vem a certeza de que, se as notas são importantes na vida acadêmica, mais importante é a avaliação que cada um faz de si mesmo, através da sua jornada de desenvolvimento como pessoa.

Celina Rabello - maio de 2012