VIÉS
De cabeça pra baixo
a perspectiva muda
e a sozinhez também.
Qual o sentido de tantas coisas prosaicas?
Contas a pagar,
tirar o pó dos móveis,
comida por fazer...
Não me conforta
ter um sapato de festa,
um brinco de princesa,
a Tunísia estar à beira do Mediterrâneo
ou termos, pelo menos, cinco sonhos por noite.
Desejo as vivências e não, o mapa.
Quero o pé no regato,
as risadas por coisa alguma,
o frio na barriga
antes do primeiro encontro,
dançar até a cabeça girar.
Fernando de Noronha marejando azul,
as tulipas explodindo cores em Ottawa,
a cachoeira cantando no Caraça,
a Ponte dos Amores me aguardando,
as ilhas gregas vestidas de azul turquesa
e a palidez dessa mesmice me estrangulando.
Quero do desfile humano
o descompasso,
do horizonte, ultrapassar a linha,
das fronteiras, todas as pontes,
o marulhar e o frescor das fontes e,
de Minas, a vontade de libertar a liberdade.
Quero da música o baile,
da noite, os becos e as serenatas
e o orvalho sobre as folhas.
Dos pássaros, o trinado, o voo.
E a voz da minha mãe ressoa:
- “O tempo urge!”
O tempo... o tempo... o tempo...
A vida não tem hora certa ou garantia.
Resignificar o relógio, como Dali.
No vento, soltar a pipa
e, no fio do equilíbrio, dançar
com a sombrinha do sonho.
Subir e subir e subir e me perder
e me encontrar no poder
desta água que parteja
o viés de um mundo transmutado,
no reflexo deste copo ensaboado
e enxaguado.
no reflexo deste copo ensaboado
e enxaguado.
Celina
Rabello – BH -
19/05/2018