sábado, 30 de maio de 2015

LUZ


Abro as asas do dia.
Trezentos mil quilômetros
e um segundo:
risco o céu, rasgo véus,
posso incendiar a chuva.


Atônita de azul,
bêbada de claridade,
a manhã boceja e vacila,
surgida do opaco.



Sem estatuto de valia,
uma saudade hieroglífica
põe silêncio e quebranto
na beleza-menina do dia.


Faísco-lhe a barra da saia,
esquento-lhe o corpo alvacento.
Em vão atravesso o vento,
não toco o seu coração.


A manhã, beleza-menina,
toda vestida de brilho,
não perde a dor do olhar,
o roxo pinta o amarilho.


Avança a madureza do dia
e a sombra sem alarde,
sob o peso do quebranto,
turva meu brilho  na tarde.


Nas asas entorpecidas
do dia, que vira noite,
essa saudade vivida,
queimando como um açoite.


A noite, em metamorfose,
despe a casca do quebranto.
Faz amor com as estrelas
e adormece em acalanto.


Gira a roda da vida,
gesta outra esperança.
Novo ciclo, novo dia,
luz e sombra em aliança.


Celina Rabello – 27/05/2015