quarta-feira, 16 de agosto de 2017




VAGAR




No meu vagar de pastora,
empino pensamentos,
colho, no reflexo das águas,
 memórias, sentimentos
e floresço em exclamações,
interrogações e reticências.


Aparece e se esconde,
senta-se ao meu lado
e foge em disparada
o ser das coisas,
o sentido da existência,
o mistério da vida.

Tela de Jullian Gallasch

A beleza e a finitude,
o eterno e o efêmero
olham-me, de través,
alternam risos e pranto,
 máscaras e verdade,
num rodopio circular,
numa dança carnavalesca,
paradoxo entre a natureza e a razão.
O eterno retorno versus
a linearidade própria de Athená:
 concentração, desfile e apoteose.


Marcham, solenemente,
sucedem-se em continência,
num arremedo de honraria,
troça, malícia e zombaria,
as grandes e inalteráveis
 perguntas humanas.


Tela de Jullian Gallasch
Herdeira universal
das dúvidas e do espanto,
em lampejos de entendimento
e solfejos de intuição,
ouço a música sacra
e profana do mundo.


Numa atmosfera quase mística,
celebro as possibilidades
 dos dois pontos
e do travessão. 



Pastora, no labirinto,
sigo o fio de luz do oriente.
Esqueço as perguntas,
o pasmo da vertigem
e rendo-me ao caminho
apontado pela estrela.


Volto ao pastoreio.
A água ainda marulha,
as ovelhas-pensamento
mastigam o verde
 e o eterno recomeço.




Celina Rabello – BH, 14/08/17